Integração de bacias

Renato Augusto Pontes Cunha

A integração do Rio São Francisco, a partir da divisa entre Pernambuco e Bahia, pode se constituir determinante para a inclusão do semi-árido ao desenvolvimento sustentável do País, acarretando melhoria de vida para mais de 12 milhões de pessoas.

A priori, essa integração pode ser feita em direção às bacias do Nordeste setentrional, na rota de dois grandes eixos, a saber, o eixo leste ( entre Cabrobó e Nova Petrolândia, em princípio no rumo de Monteiro e Boqueirão na Paraíba com cerca de 220 quilômetros, levando água para os rios Moxotó, em Pernambuco, e Paraíba, na Paraíba). Outra direção obedece ao eixo norte , com cerca de 402 quilômetros (com captação nas imediações de Cabrobó, Pernambuco, no sentido do Rio Grande do Norte e Ceará), envolvendo aumento de potencial hídrico nos rios Salgado e Jaguaribe, no Ceará; Apodi, no Rio Grande do Norte; Brígida, em Pernambuco e Piranhas-Açú, na Paraíba/Rio Grande do Norte, salvo algumas variações técnicas, de curso, porventura, ainda, recomendadas para melhor otimização de resultados sócio-econômicos.

No entanto, a antiga “transposição” – ou atual “integração” – só ganhará auto-sustentabilidade se o projeto for integrado e compartilhar, em nossa ótica, estratégia atrelada a outros 2 (dois) projetos, já em andamento, como afirmou, recentemente, o Governador de Pernambuco (Pernambuco e Bahia são, neste caso, os dois Estados doadores de águas). A primeira , é a de explorar o canal do sertão, com vocação agrícola, notadamente para frutas e cana-de-açúcar. Nasce no município de Casa Nova, na Bahia, e se estende por Afrânio, Dormentes, Santa Cruz, Santa Filomena, Trindade, Ouricuri, Bodocó, Exu e Morelândia. Todos esses municípios tiveram estudos detalhados de solos, feitos pela Codevasf, desde 2002, atestando presenças de excelentes manchas contínuas de podzólicos e latosolos. A segunda orienta-se pela adutora do Oeste , na primeira fase, provavelmente com 107 km, abastecendo mais de 60 mil pessoas e nascendo em Orocó.

Os projetos de integração de bacias, do canal do sertão e da adutora do Oeste formam um só complexo de gestão hídrica, todos com origem na mesma fonte: o rio São Francisco. Essa gestão deve cuidar para que sejam respeitados os direcionamentos ambientais das águas e assegurar a preservação da fauna e da flora nativas. Além disso, deve buscar otimizar também a revitalização do Rio, através da recomposição de matas ciliares, compatibilizando essas iniciativas com as necessidades de geração de energia elétrica do sistema Chesf.

Assim, os três projetos – ou suas consolidações em um programa de trabalho de gerenciamento de obras hídricas do semi-árido – acarretarão estímulos a investimentos em uma matriz limpa e sustentável, envolvendo múltiplos arranjos produtivos locais, conectados com o(s) mercado(s) consumidor(es). É o caso do etanol da cana, do açúcar, das frutas, do algodão, do sorgo e da mamona/biodiesel etílico. No caso da cana-de-açúcar, adiciona-se um diferencial positivo importante: a produção de energia elétrica de Biomassa ou de Bioeletricidade, aliada à produção de bagaço de cana susceptível de contribuir para alimentar o pólo ovino/caprino da região.

O nosso País, ainda consome cerca de US$ 1 bilhão de dólares na importação de óleo diesel, desperdiçando o significativo potencial agrícola das terras ensolaradas do Nordeste. O agronegócio nacional gera 18 milhões de empregos, mas nossa região pouco participa desse contingente. São cerca de mais de US$ 40 bilhões de dólares exportados pelo setor agrícola, volume que se concentra, sobretudo, no Centro-Sul e no Centro-Oeste, cujas distâncias até os portos chegam a atingir mais de 1.000 km do litoral – como é o caso de Campo Grande-MS, com 1.086 km para a costa paulista e de Cuiabá-MT com 1.600 km. Em contrapartida, Petrolina, dista apenas 760 km da costa nordestina, e Serra Talhada, apenas 412 km, o que viabiliza até eventuais escoamentos via corredores de exportação.

Estamos convictos de que, no mínimo, 500.000 hectares de terras de nossa região poderiam ser legados às gerações futuras com menos assimetrias. Somente o complexo de soja do Centro-Sul destina cerca de US$ 10 bilhões de dólares em exportações anuais para o Exterior, o que representa, de acordo com os dados econômicos aferidos pelo IBGE para o ano de 2001, a soma dos PIB's do Rio Grande do Norte e de Alagoas, ou, ainda, 55% do de Pernambuco e 83% do PIB do Ceará.

A alavancagem sócio-econômica do semi-árido do Nordeste é, nesse contexto, uma iniciativa que cabe ser abraçada por toda a sociedade brasileira, cabendo a todos nós colaborar para que estratégias organizadas de viabilização desta grande oportunidade venham a ser uma realidade e deixem de ser apenas uma saudável utopia.

* Presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco - SINDAÇÚCAR
(rcunha@sindacucar.com.br)